sábado, 4 de junho de 2022

Outro fichamento da obra "O lugar do marxismo na História" de Ernest Mandel.

Fichamento realizado na faculdade. O objetivo desta publicação é apenas de caráter pedagógico e do incentivo a leitura da obra do autor. Se você gostou das passagens abaixo selecionadas, pode e deve comprar o livro.

AS CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS DO MARXISMO

“O marxismo aparece ao mesmo tempo como uma transformação revolucionária e como uma unificação progressiva:

  • das ciências humanas, mais exatamente das ciências sociais;

  • do movimento político de emancipação, antes de tudo das organizações revolucionárias, nascidas da extrema-esquerda da Revolução Francesa;

  • do movimento operário elementar espontâneo, criado pelos próprios trabalhadores, independentemente de qualquer teoria filosófica ou sociológica;

  • do socialismo pré-marxista, ou seja, da elaboração de projetos de uma sociedade melhor, de “soluções para a questão social” essencialmente no nível teórico e ideológico: teorias filosóficas, sociológicas, econômicas combinadas com atividades educativas e filantrópicas (fundação das primeiras colônias “comunistas”).”


“Na área das ciências sociais, a apropriação crítica refere-se, sobretudo, a filosofia clássica alemã, à economia política inglesa e a historiografia sociológica francesa, que descobria e aplicara os conceitos de classes sociais e luta de classes.”


“O marxismo aparece, assim, como uma síntese quádrupla:


  • síntese entre as principais ciências sociais;

  • síntese entre as ciências sociais e o projeto de emancipação da humanidade;

  • síntese entre o projeto de emancipação humana e o movimento real de auto-organização e auto-emancipação do proletariado moderno;

  • síntese entre esse movimento operário real e a ação de organização política revolucionárias.”


AS TRANSFORMAÇÕES DAS CIÊNCIAS SOCIAIS PELO MARXISMO


  1. A transformação da filosofia clássica alemã


“Marx e Engels procuraram corrigir essas fraquezas da dialética idealista “recolocando-a sobre seus pés” (subentendido: Hegel a tinha colocado sobre a cabeça, ou seja, de cabeça para baixo). Assim, a mesmo tempo, eles transformaram a dialética idealista em dialética materialista. Esta baseia-se nas seguintes constatações:


    1. A realidade material (a natureza e a sociedade) existem independentemente dos desejos, paixões, intenções e idéias dos que procuram interpretá-la. Ela é uma realidade objetiva, que o pensamento procura explicar.”

    2. “[...] O critério final do grau de veracidade do pensamento, da ciência, é, portanto, prático.”

    3. “[...] Os seres humanos reais e concretos são os seres humanos social e historicamente específicos, ou seja, determinados pelas condições sociais específicas nas quais eles vivem, condições que mudam de acordo com a época histórica.

    4. O movimento de emancipação real que se realiza progressivamente ao longo da história, com saltos para a frente aos quais se sucedem retrocessos graves, não é exclusivamente, nem essencialmente, nem mesmo antes de tudo, do movimento de emancipação espiritual.”


  1. A transformação da historiografia sociológica francesa


“O conjunto dessas relações de produção determina, em última instância, o conjunto das relações sociais – na sociedade de classes – e, assim a própria estrutura da sociedade. Esta é a primeira tese central do materialismo histórico.”


É a base social (a infra-estrutura), são as relações sociais de produção, que determinam em última instância essa superestrutura social, ou seja, que determinam a evolução e as formas predominantes do direito, dos costumes, da religião, da filosofia, das ciências, da arte, da literatura de cada época. É a existência social que condiciona a consciência social. Essa é a segunda tese central do materialismo histórico. Como a classe dominante controla o sobreproduto social e, portanto, toda a sociedade, a ideologia da classe dominante geralmente é a ideologia dominante de cada época.”


“O Estado é um produto da divisão da sociedade em classes, um instrumento de consolidação, de manutenção e de reprodução da dominação de uma determinada classe. Essa é a terceira tese central do materialismo histórico.


  1. A transformação da economia política inglesa


“Marx estabeleceu que o trabalho não é, antes de tudo, uma unidade de medida comum dos diferentes elementos dos custos de produção das mercadorias. Ele é a própria essência do valo. O valor é o trabalho, mas exatamente uma fração do potencial de trabalho (da massa de jornadas de trabalho/horas de trabalho) disponível em uma sociedade determinada durante um período determinado.”


“Todo assalariado produz, portanto, “valor adicional”. Mas como o capitalista paga um salário ao operário e a operária – salário que representa o custo de reprodução da força de trabalho –, ele comprará essa força de trabalho apenas se “o valor adicionado” pelo operário ou operária ultrapassa o valor da própria força de trabalho. Essa fração de valor recentemente produzida pelo assalariado é chamada por Marx de mais-valia. A mais-valia é a diferença entre o valor produzido pela força de trabalho e o valor próprio dessa força de trabalho, quer dizer, a diferença entre o valor produzido pelo trabalhador ou trabalhadora e os custos de reprodução da força de trabalho.”


A SUPERAÇÃO DO SOCIALISMO UTÓPICO


“As diferenças e contradições do socialismo utópico refletem, portanto, em última análise, a imaturidade das condições materiais (econômicas e sociais) nas quais as classes oprimidas pré-proletárias combateram por uma sociedade sem classes. Seu “utopismo” refere-se não ao objetivo a realizar, mas as condições necessárias a sua realização.”


A FUSÃO DO MOVIMENTO OPERÁRIO REAL E DO SOCIALISMO CIENTÍFICO


“Contrariamente à lenda difundida pelo inimigo de classe, os luddistas não eram de modo algum adversários das máquinas, por princípio. O objetivo de suas ações não era a eliminação das máquinas na indústria têxtil, mas sim o aumento dos salários, a luta contra a carestia e o desemprego, e outros objetivos clássicos dos primeiros sindicatos. A tática de inutilizar as máquinas se impões porque os trabalhadores essencialmente alugavam as máquinas dos patrões para trabalhar em casa. Nessas condições, o fato de inutilizar as máquinas foi considerado como meio mais eficaz de combater os fura-greves, o único meio de tornar a greve realmente geral. A burguesia ficou tão assustada com os “quebradores de máquinas’ que fez aprovar uma lei sancionando esse “crime” com a pena de morte.”


O ITINERÁRIO PESSOAL DE MARX E ENGELS


“Nos países em que seus partidários começavam a se organizar, Marx e Engels insistiam para que eles estudassem a formação social concreta o país, para que se apropriassem das tradições de luta locais e traduzissem seu programa na linguagem das organizações operárias e contestatórias existentes; esse é o sentido geral de suas Cartas aos Americanos, de 1848 a 1885.”


RECEPÇÃO E DIFUSÃO DO MARXISMO PELO MUNDO


“A recepção e a difusão do marxismo no mundo devem, portanto, ser examinadas sucessivamente:


  1. no plano estrito da difusão dos escritos de Marx e Engels;

  2. no plano da influÊncia dessas idéias fora do movimento operário propriamente dito, ou seja, nos meios intelectuais, universitários e, em geral, no “espírito do tempo” (as ideologias dominantes nas fases sucessivas pelas quais a sociedade burguesa passa);

  3. no seio do movimento operário organizado;

  4. no seio da classe operária de modo geral;

  5. a nível internacional”


“Entretanto, o marxismo influenciará de maneira crescente, ainda que indireta, as ciências sociais acadêmicas, principalmente a historiografia e a sociologia, impondo uma tomada de consciência da importância do “fator econômico” e dos grupos sociais (ao contrários dos “grandes homens”) na história. Ele remodela assim o conceito mesmo de história, de uma história de Estados e acontecimentos essencialmente político-militares para uma história de sociedades.”