Esta é uma resenha da obra "O que é a propriedade?" De Proudhon.
O que é a Propriedade?
Pierre Joseph Proudhon.
Introdução:
Em primeiro de maio de 1841, Louis
Blanqui, professor Universitário da Universidade de Besaçon,
escreve carta a Proudhon contando de suas árduas tarefas para
defendê-lo diante do Ministério Público Francês, que queria a
todo custo prender Proudhon pela publicação desta obra. Coube a
Blanqui convencer os Ministros de que tal obra, sobre a qual nos
debruçamos, era apenas material única e exclusivamente acadêmico e
não um panfleto incendiário, como diria o próprio Blanqui.
Antes disso, porém, Proudhon envia a
carta a academia de Besaçon e recebe resposta da mesma a qual nosso
ilustre autor também publica nesta segunda edição da obra.
Proudhon também traz a carta de Blanqui, a qual tece grandes
simpatias pelo autor e parabeniza-o pelas correções na obra.
1° Proposição: A propriedade
é impossível porque do nada exige alguma coisa.
Quando Proudhon nos diz do nada, ele
simplesmente está tentando se referir que da ausência de trabalho,
não se fabrica ou não se realiza ou não se constrói nada. Esta
afirmação quer dizer que da produção da natureza, o proprietário
suga e vende e re-vende algo que não foi ele quem fez e sim a
natureza. Portanto, é um triplo roubo: da natureza, dos operários e
da sociedade.
“Instrumentos
e capitais, terra, trabalho, separados e considerados abstratamente,
só são produzidos por metáfora. O proprietário que exige
remuneração como preço do serviço de seu instrumento, da força
produtiva de sua terra, supõe então um fato radicalmente falso, a
saber, que os capitais produzem por si mesmos alguma coisa; e,
fazendo-se pagar esse produto imaginário, recebe literalmente algo
por nada.”
O roubo neste caso se dá quando o
proprietário, baseado num pedaço de papel que diz ser este pedaço
do solo de seu mando, cobra por um arrendamento de sua terra sem
produzir absolutamente nada. Foi a natureza com o trabalho do
camponês ao plantar as sementes quem produziu a riqueza gerada pela
terra. E é o proprietário quem fica com o resultado da produção.
“Portanto,
entre o proprietário e o arrendatário não há de forma alguma
troca de valores ou serviços; (...) o arrendamento é um verdadeiro
ganho, uma extorsão fundamentada unicamente na fraude e na
violência, por um lado e da fraqueza e na ignorância por outro. Os
produtos, dizem os economistas, só se compram com produtos. Esse
aforismo é a condenação da propriedade. O proprietário, não
produzindo nem por si nem por seu instrumento, e recebendo produtos
em troca de nada, é ou parasita ou ladrão. Portanto, se a
propriedade só pode existir como direito, ela é impossível.”
Em outras palavras, Proudhon nos quer
dizer que o proprietário não entra com nada, e o trabalhador entra
com a mão de obra e a produção. Pode-se neste caso
contra-argumentar de que o proprietário entrou com a sua
propriedade, a sua posse da terra, porém, como conseguiu este
adquirir a propriedade? De duas maneiras: 1 - Explorando a mão de
obra de outros trabalhadores ou 2 - Recebendo por herança de
família, mas que nos remeterá sempre a 1° maneira de se adquirir a
propriedade. Ou seja, a velha máxima da sociedade capitalista de que
trabalhando as pessoas podem enriquecer é uma estória tão ou mais
mentirosa do que a da carrocinha. Ninguém enriquece trabalhando, mas
sim explorando a mão de obra de outros trabalhadores ou arrendando
sua própria
propriedade o que significa dizer que outros trabalhadores também
serão explorados.
2° Proposição: A propriedade
é impossível porque onde é admitida a produção custa mais do que
vale.
A produção não se sustenta no
regime da propriedade! Para o autor “vadiagem e vagabundagem” são
sinônimos da existência da propriedade. Pois este é o modo de vida
do burguês. Para Proudhon, a destruição de um produto para a
construção de outro que seja inútil (socialmente falando) é
prejuízo a sociedade. O que nos dá a entender que de certa forma, a
existência portanto, da sociedade de consumo é desperdício de
tempo, trabalho e matéria prima para a construção de produtos
inúteis e supérfluos.
Outro argumento que o autor utiliza
para justificar o alto custo da produção no regime de propriedade,
é que a produção precisa necessariamente ser igual ao consumo. Se
há sobra, existe prejuízo. Portanto tem que haver uma equação
entre ambas (produção e consumo) para que sejam justas. Para
Proudhon, a sociedade justa é a livre associação entre produtores
e consumidores.
“O
consumo por sua vez, para ser legítimo, para constituir um
verdadeiro consumo, deve reproduzir utilidade; pois, se for
improdutivo, os produtos que destruir serão valores anulados, coisas
inutilmente produzidas, circunstância que rebaixa os produtos a
nível inferior a seu valor. O homem tem o poder de destruir, só
consome aquilo que reproduz. Numa Economia justa há, portanto,
equação entre produção e consumo.”
A existência de estoques para
armazenar as sobras de produção, é ao ver do autor, desnecessária
nesta futura sociedade “justa”. Pois, se vivemos numa sociedade
comunitária, não há porque faltar algo aos trabalhadores, quando
tudo o que é produzido é repartido entre todos conforme suas
necessidades.
3° Proposição: A propriedade
é impossível porque, com um dão capital, a produção está na
razão do trabalho, não na razão da propriedade.
“Estabeleçamos
então, como Lei da economia proprietária, o seguinte axioma: o
ganho deve diminuir a medida que o número de ociosos aumenta (...)
trata-se de nos livramos de uma vez de todos os encargos da
propriedade sem aboli-la, sem prejudicar os proprietários, e
mediante um procedimento eminentemente conservador.”
A propriedade só é possível só é
possível se houver trabalho que justifique sua existência. A
propriedade é impossível pois o proprietário, sozinho, não tem
condições de nela produzir a ponto de sustentá-la. É o trabalho
que produz riqueza e gera por sua vez o capital e não a estática
existência da propriedade ou sua simples inércia.
“Pois
não é o trabalhador, que não faltou a nenhuma de suas funções e
continuou a produzir como antes, que deve pagar pela retirada do
proprietário; este é que deve sofrer as conseqüências de sua
ociosidade.”
Quem financia a produção é sempre o
operário e não o patrão! Por mais que este se acumule de dívidas
para iniciar um empreendimento, quem dará o trabalho a espera de
resultados, quem inicia a criação da riqueza é sempre o operário
e não o patrão.
4° Proposição: A propriedade
é impossível porque é homicida.
Manter a propriedade para auto
sustento é ruína e quebra do próprio patrimônio. Ao se utilizar a
própria propriedade para uso de consumo pessoal, os encargos que ela
mesma produz, os impostos, entre outros, depreciam-na automaticamente
fazendo com que ela se auto-devore.
“Dirão,
enfim, que é preciso trabalhar mais e melhor? Mas o arrendamento foi
calculado sobre uma média de produção que não pode ser excedida:
do contrário, o proprietário cobraria mais.”
E continua:
“O
proprietário permanece estranho a ação social: mas, como o abutre,
os filhos fixos na presa, está sempre pronto a lançar-se sobre ela
e devorá-la.”
É o trabalhador que se arrisca e quem
financia a produção. É com seu suor que ele começa os trabalhos
aos ventos e ao bel sabor dos mercados e aos humores dos
capitalistas. Para dar conta da terra que assumiu, precisa trabalhar
mais do que pode. E trabalhando acima do que foi acordado com o
proprietário, é obrigado a pagar mais por isso.
“Em
suma, a propriedade, após despojar o trabalhador pela usura,
assassina-o lentamente pelo esgotamento; ora, sem a espoliação e o
assassinato a propriedade não é nada; com a espoliação e o
assassinato, ela logo perece, desamparada: logo, é impossível.”
5° Proposição: A propriedade
é impossível porque com ela a sociedade se devora.
“A
propriedade vende ao trabalhador o produto por um preço maior que o
que lhe paga; portanto, é impossível.”
Ao produzir um determinado produto,
está contido ali toda a experiência, conhecimento, técnica,
sabedoria da Indústria e do próprio trabalhador. Porém, para que o
proprietário tenha lucro, ele precisa vender a mercadoria produzida
pelo operário e lhe pagar menos do que o que foi produzido. Somado a
esse aumento do valor do produto fabricado, o proprietário precisa
adicionar os impostos e demais custos da produção sobre cada
mercadoria que será vendida. No fim das contas, o produto que foi
fabricado pelo trabalhador e será vendido pelo patrão, sairá mais
caro do que quando foi produzido e por sua vez, o operário recebeu
de salário, menos do que produziu. Como comprará tal produto? Como
comprará em pé de igualdade (para que se sustente minimamente) tal
produto nestas condições?
6° Proposição: A propriedade
é impossível porque é mãe da tirania.
A função do Estado é proteger o
proprietário e permitir ao mesmo que ele exerça a livre
concorrência afim de manter “sadia” as relações entre os
diversos capitalistas.
Para Proudhon,
“Num
país de propriedade, a igualdade de direitos eleitorais viola a
propriedade”
e continua pouco a seguir: “Se
os atuais representantes da oposição radical chegassem ao poder,
fariam uma reforma pela qual todo guarda nacional seria eleitor e
todo eleitor seria elegível: ataque a propriedade.”
Infelizmente, Proudhon acreditava que
simples alterações na legislação que buscassem incidir mais
impostos sobre a propriedade, fariam com que a mesma sofresse um
forte ataque.
Porém, é claro para o autor que o
Estado é o guardião da propriedade pois tem como principal função
a defesa da mesma. O Estado nasce como necessidade de ser a
ferramenta de defesa da propriedade privada.
7° Proposição: A propriedade
é impossível porque ao consumir o que recebe perde-o, ao poupar
anula-o,
ao capitalizar, volta contra a produção.
O autor não acredita que poupar os
ganhos que o proprietário obtém com o arrendamento da propriedade
ou a exploração da mão de obra de terceiros, possa ser bom
negócio. Para ele, moedas não fabricam moedas. Ou seja, o simples
fato de juntar dinheiro e guardá-lo não é sadio para a sociedade e
nem para quem poupa. Proudhon não está levando em conta que o
dinheiro poupado hoje em dia em bancos pode ganhar com juros e nem
está levando em conta a depreciação do dinheiro pela inflação.
Porém, tem-se razão quando se afirma
que ao se estacionar a circulação de divisas imobilizando boa
quantidade de moedas (ao invés de colocá-las em circulação), pode
se criar (sendo um processo maciço) um estrangulamento ou
paralisação de parte da economia de um país. Portanto, o
proprietário ao poupar, faz mal a economia da nação.
“O
proprietário que poupa não goza e impede os outros de fazê-lo;
para ele, nem posse nem propriedade. Como o avarento, esconde seu
tesouro: não o utiliza (...) Não há propriedade plena sem gozo,
não há gozo sem consumo, não há consumo sem perda de propriedade:
tal é a inflexível necessidade na qual o julgamento de deus colocou
o proprietário. Maldita seja a propriedade!”
Quanto mais o proprietário capitaliza
seu ganho, mais dinheiro retira da produção, mais dinheiro retira
dos salários, menos consumo haverá, por seguinte, menor será a
necessidade da produção (pois se está consumindo menos) e assim,
neste jogo, a economia tem enfraquecida a velocidade de sua roda.
8° Proposição: A propriedade
é impossível porque seu poder de acumulação é infinito e só se
exerce sobre quantidades finitas.
“Se
todas as Instituições tem por princípio um erro de cálculo, não
se segue que estas Instituições são outras tantas mentiras? E se
todo o edifício social erigiu-se sobre essa absoluta impossibilidade
da propriedade, não é verdade que o governo sob o qual vivemos é
uma quimera e a sociedade atual uma utopia?”
O poder de acumulação de riquezas é
enorme, mas isso tem um preço. Manter a riqueza em constante
crescimento em mãos dos proprietários é o mesmo que provocar uma
desigualdade sócio-econômica muito forte o que seria um passo para
a decadência de todo o sistema. O processo de exploração
capitalista tem alguns limites tais como o esgotamento dos recursos
naturais (matéria prima), o esgotamento da paciência da classe
trabalhadora (haja paciência), e o próprio limite de extração da
mais valia tanto do ponto de vista das técnicas utilizadas na
produção (mais valia relativa) quanto do aumento de horas extras e
da jornada de trabalho (mais valia absoluta). Por isso da importância
de sempre se diminuir a jornada de trabalho.
9° Proposição: A propriedade
é impossível porque é impotente contra a propriedade.
“Formemos
uma cadeia de dez, quinze, vinte produtores, tão comprida quanto se
queira: se o produtor A lucra sobre o produtor B, de acordo com os
princípios econômicos B deve se fazer reembolsar por C, C por D, e
assim sucessivamente até Z.
Mas
quem reembolsará Z pelo lucro inicialmente obtido por A? O
consumidor.”
Para Proudhon, o consumidor neste caso
também será o próprio proprietário. Ou seja, a propriedade volta
a depreciar a si mesma, volta-se contra ela própria pois no
capitalismo, o patrão necessita lesionar alguém (os trabalhadores
ou outros patrões) para que obtenha lucro. E continua:
“Logo,
visto que uma nação, como a humanidade inteira, é uma grande
sociedade industrial que não pode agir fora de si mesma, fica
demonstrado que nenhum homem pode enriquecer sem que um outro
empobreça. Pois, para que o direito de propriedade, de ganho, seja
respeitado em A, cumpre que seja recusado a Z;”
Aqui Proudhon lança as bases para que
mais adiante se chamará por “Internacionalismo Proletário”.
Bandeira de luta das classes operárias que enxerga apenas o
proletariado mundial como única família e uma única pátria, o
próprio planeta: “Minha pátria é o mundo, minha família a
humanidade!”
10° Proposição: A propriedade
é impossível porque é a negação da igualdade.
Esta última proposição é nada mais
do que um resumo de todas as outras 9 proposições.