sábado, 4 de junho de 2022

Max Weber, Política como vocação.

 

Max Weber. Ciência e política: duas vocações. Editora Cultrix. São Paulo-SP.


Política como vocação:


Max Weber (1864-1920) foi um dos três grandes Sociólogos da história desta Ciência, juntamente com Durkheim e Marx. Weber se propõe neste ensaio, entre outras coisas, descrever o que é a vocação política. Weber nos fala sobre seu entendimento de Política: “conjunto de esforços feitos com vistas a participar do poder ou a influenciar a divisão do poder, seja entre Estados, seja no interior de um único Estado.” 1 O Estado só pode existir, segundo o autor, se os homens aceitarem sua autoridade e se submeterem a mesma.


Para o autor, existem dois tipos de administrações, o que o governante consegue governar por que existe uma estrutura do funcionalismo independente da vontade do chefe de governo e outro tipo privada ao dono do poder do Estado e que caso caia em mãos de oposição, nada fará para manter a governança necessária das coisas. Também existem dois tipos de funcionários no Estado: os que são geralmente concursados e são conhecidos como funcionários de carreira e aqueles que são funcionários políticos e que são inseridos na máquina Estatal através de indicações políticas. Para Weber, o verdadeiro funcionário deve ser aquele que mesmo contrariado com as ações que deve tomar no seu trabalho, acata as ordens superiores pois são ordens do Estado e seu papel é o de cumpri-las. Já o funcionário político, só faz aquilo que interessa ao seu partido ou liderança pouco se importando com os demais projetos e com o dinheiro público. Pg. 78 e 79.


Weber também critica a Revolução Russa por ter aparelhado o Estado com militantes do Partido Bolchevique e por ter inserido nos cargos da Polícia Política os mesmos ex-policiais da polícia czarista da Rússia. Por ter aberto as portas ao investimento do capital internacional, por ter inserido técnicas do taylorismo e do fordismo nas fábricas além das disciplinas de quartéis nos operários. Tudo aquilo que um regime democrático não faria. Pg. 85.


Acreditava o autor que existiam três tipos de dominação que raramente apareciam sozinhos e geralmente aconteciam de serem percebidos uns ligados aos outros. São eles:


1 - Tipo de Dominação Tradicional: É a autoridade do “passado eterno”, santificados pela falta de memória das pessoas, está no poder pelo hábito, pela tradição, é o velho senhor feudal que se enraizou no comando do feudo a tempos. O velho coronel das regiões secas e semi-áridas do sertão pode ser outro representante deste velho mandatário.


2 – Tipo de Dominação Carismático: Ele se apóia em seus dons da conversação e do discurso. Pode ser o velho político populista que ganha o amor, respeito e obediência das massas mediante seu heroísmo, seus ganhos, caso fosse um guerreiro ou militar vitorioso em suas campanhas. Geralmente pode ser um chefe de partido ou de algum movimento social ou popular numa determinada sociedade.


3 – Tipo de Dominação Legal: Existe outra categoria de autoridade que se empossa baseado num Estatuto, Leis, conjunto de regras previamente definidas ou uma Constituição. É o que Weber chama de dominação racional/legal. Geralmente vence ou é escolhido por sua competência. Um típico exemplo deste tipo de autoridade é o Juiz de Direito que só inicia a carreira da Magistratura por sua sabedoria das Leis e outros quesitos e sua competência por ter sido aprovado numa prova.


Há duas maneiras de se fazer política: Ou se “vive para a política” ou se “vive da política”. Esta é uma explicação muito fácil. O primeiro caso, trata-se geralmente de pessoas que subirão ao comando do Poder do Estado sem outra fonte de renda (ou até geralmente com outra fonte de renda) e sobreviverão graças ao seu salário de político. E assim este política viverá sugando os recursos do Estado para sempre. A outra forma, é aquele em que se tem uma outra fonte de renda e se vive para defender o espírito republicano. Weber acredita que a segunda hipótese, ou seja, os homens que já possuem uma fonte segura de renda, são melhores administradores pois estão livres dos dilemas de seus ganha pães cotidianos.


Conceito de Estado:


O conceito de Estado para Weber está amparado na seguinte sentença: “...devemos conceber o Estado contemporâneo como uma comunidade humana que, dentro dos limites de determinado território (...) reivindica o monopólio do uso legítimo da violência física.2 Para Weber, assim como para Trotsky, o Estado se fundamenta no uso da força e da violência física. Não existe Estado sem estas qualidades. Acredita-se que Weber, ao pensar num Estado que necessite de tais características, recorre a Thomas Hobbes, Filósofo inglês, autor da obra “Leviatã” de 1651, onde fica exposto que os súditos abrem mão de seus direitos para uso exclusivo da força física nas mãos do Estado afim de preservar a vida e evitar a guerra de todos contra todos. Não que Weber irá concordar que as pessoas hoje em dia abrissem mão de seus direitos, mas assim como Hobbes, que elas devem abrir mão do uso da violência para que o somente o Estado tenha a posse de tal ferramenta.


Weber também irá analisar as condutas dos políticos do passado e de seu presente, argumentando em diversos exemplos o quanto o Estado foi vítima de espoliação e corrupção durante toda a história da Humanidade. Ficará claro que a única forma de se amenizar o mal que se chama corrupção e ausência de espírito republicano entre os políticos que “vivem da política” e não os que “vivem para a política” é aperfeiçoar e aprofundar mecanismos que fortaleçam hábitos e “ethos” em prol da constitucionalidade e respeito às regras do jogo democrático.


Finaliza Weber neste ensaio argumentando que a Política deve ser para os que tem baseado na racionalidade a construção de um novo mundo. Lembra Maquiavel em diversos momentos e que somente a fria mas racional verdade e a “ética da convicção” e a “ética da responsabilidade” devem amparar o governante. E não os obscurantismos das boas almas. A “ética da convicção” é aquela em que o indivíduo acredita tão profundamente e cegamente que sua doutrina ou ideologia seja a mais correta e a irretocável e que por esse motivo quaisquer que forem os atos em seu favor estarão legitimados por uma prévia idéia de que ele e sua proposta de sociedade é que estão ao lado da verdade e da razão. Será por isso que o pedantismo do Marxismo seja também o de ter se auto-intitulado Socialismo Científico? Para o partidário deste tipo de ética, o seu fazer o bem não leva em consideração parte da sociedade que provavelmente ira sofrer diante de uma ação mais radical ou violenta. Por exemplo, um revolucionário que resolve por uma bomba num café de uma avenida cara e chique de uma grande metrópole mundial, matará vários “burgueses” na sua concepção, o que vingará em parte a dor e sofrimento que o proletariado sofre nas periferias das grandes cidades. Tal atitude não leva em conta parcela da sociedade que se prejudicará com seu ato. Já a “ética da responsabilidade” leva em conta tais consequências, mas peca por ser universal, ou seja, é baseada numa regra que não venha a ferir os indivíduos que formam uma determinada sociedade. Provavelmente aí resida a influência do “Imperativo Categórico” Kantiano sobre esta segunda noção de ética que o autor nos fala.


Weber irá tratar também da política partidária suja e inescrupulosa que só vive de abocanhar cargos. Acredita que os Partidos (já em sua época) ficam mais preocupados e furiosos quando os cargos que lhes eram prometidos não são entregues do que se os programas partidários estão sendo desrespeitados.


Considerações:


Podemos pensar em Weber e nos seus conceitos puros de dominação para encaixarmos alguns líderes políticos atuais em seus esquemas? Para alguns Sociólogos e Cientistas Políticos, sim. O ex Presidente Lula foi tido por um Cientista Político Brasileiro em seu primeiro mandato como uma figura do “Tipo de dominação Carismática”. Acreditava tal Cientista que as massas tinham respeito e carinho pelo Presidente pela forma fácil e atraente com que se dirigia ao povo falando geralmente de forma simples e bem humorada, o que acabou cativando o público. Para outros, o Presidente Chaves da Venezuela seria o “Tipo de dominação Tradicional” pois sempre utiliza seu passado de militar revolucionário e mais recentemente ao resistir e sobreviver ao golpe que sofreu quando tentaram retirá-lo do poder.


Os diversos casos de corrupção como os “mensalões” e “mensalinhos” da vida, podem ser analisados sob a “ética da convicção” e a “ética da responsabilidade” de Weber: a primeira pela crença em fazer o bem na política (sem levar em consideração as consequências que irão surgir a partir de seus atos) e a segunda, pelo respeito ao que é do público e não do privado.


Outra questão que devemos tratar das duas éticas de que o autor nos comenta em sua fala, é de certa forma uma inocência a respeito das mesmas. Como é possível uma ética universal (a “ética da responsabilidade”) numa sociedade dividida economicamente, culturalmente e socialmente? Em outras palavras, como é possível uma ética numa sociedade de classes? A meu ver, parece impossível.


Outra questão, quando Weber critica o impulso do militante da “ética da convicção” por somente levar em consideração dos seus atos aquilo que ele acredita e, respeitar somente o que sua doutrina ordena, ele, o militante da “causa revolucionária”, põe em desrespeito todo o restante da sociedade ou parcela importante dela. Portanto, é uma ética parcial perante o restante da sociedade. Aí voltamos a pergunta anterior: é possível uma ética única numa sociedade de classes? Eu acredito que não.

1 Weber, Max. Ciência e Política: duas vocações. Editora Cultrix. São Paulo-SP. Pg.56.

2 Op. Cit. Pg.56.